Certo dia, andando pelas ruas de Veneza, deparei-me com duas pessoas na porta de uma Igreja. Um senhor e uma senhora, aparentemente da mesma idade. Ambos fazendo o mesmo esforço: cada qual, à sua maneira, se expunha tentando chamar a atenção daqueles que passeavam pelas ruas, para ganhar umas moedas. Provavelmente aquele era o trabalho de ambos.
Todavia, havia uma diferença substancial entre os dois.
O senhor chamava a atenção pelo o que tinha de mais bonito e encantador. A voz e a desenvoltura para cantar, talvez nata ou desenvolvida ao longo da vida. Seu timbre de tenor, cantando “Ave Maria” na frente da Igreja sensibilizava os corações daqueles que por ali passavam que, em retribuição, lhe jogavam moedas, o que certamente garantiu seu jantar naquele dia.
Já a senhora chamava a atenção pelo o que de mais sofrido ela tinha dentro de si. Com postura de fragilidade e sofrimento despertava o sentimento de compaixão e culpa em todos aqueles que passavam pela Igreja que, em retribuição, lhe jogavam moedas, o que também certamente garantiu o seu jantar naquele dia.
Acredito que tanto o senhor, como a senhora, devam ter dentro de si repertórios de encantos e sofrimentos, força e fraqueza, beleza e feiura, amores e dores. E cada um deles optou por um caminho diverso para ganhar as moedas de suas vidas.
Nós, também, temos todos esses repertórios e somos os responsáveis pelos caminhos que escolhemos para ganhar as nossas moedas, em todos os campos da nossa vida. Sejam as moedas financeiras, as do amor, as dos laços de amizade. Temos, a todo instante, a possibilidade e o livre arbítrio de decidirmos se queremos mostrar o nosso encantamento para ganhar as nossas moedas daqueles que passam pelas nossas vidas ou, ao contrário, esperar que os outros por dó, compaixão ou pena nos ajude.
Provavelmente os dois ganharam a mesma quantidade de moeda naquela tarde. Cada qual pelo seu caminho. E eu, naquele instante, parei: olhei o mar, o céu, a mim e agradeci a oportunidade do aprendizado.
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